Porto Maravilha: mobiliário urbano e espaço público em evidência

Karine Dias de Jesus, Juliana Varejão Giese, Antonio Ferreira Colchete Filho
2018 Blucher Design Proceedings   unpublished
A cidade configura-se como palco de inúmeras transformações que podem ser percebidas em diversas escalas. As transformações pelas quais passam os espaços públicos são de grande importância no contexto da cidade, por estarem diretamente relacionadas com a convivência dos indivíduos neles inseridos. A partir da década de 1990, o design urbano brasileiro incorporou em seus projetos teorias norteadoras da qualidade do espaço público urbano para os cidadãos que visam promover a humanização dos
more » ... s públicos em escala proporcional aos indivíduos, levando em conta que a relação entre o espaço e o cidadão se dá através de diversos elementos urbanos, entre eles o mobiliário urbano. O objetivo deste artigo é evidenciar os aspectos conceituais que envolvem o mobiliário urbano e seu papel no espaço público contemporâneo, estimulando a discussão teóricoconceitual que cerca o tema. Tendo como delimitação de estudo a requalificação das áreas da Praça Mauá e da Orla Conde, inseridas no Projeto Porto Maravilha na zona portuária do Rio de Janeiro-RJ, decorrente dos Jogos Olímpicos de 2016, a pesquisa pautou-se em revisão bibliográfica dos conceitos relacionados ao mobiliário urbano e na importância desses elementos na concepção de um projeto de requalificação de áreas urbanas. O levantamento dos aspectos que estimulam as possibilidades teóricas e conceituais fundamentou a análise do mobiliário urbano planejado para a região. Conclui-se que mesmo com o efeito positivo do projeto de intervenção realizado para a área, que tem se configurado como um novo marco espacial da cidade, o projeto do mobiliário urbano e as questões afetas a estes ainda necessitam de uma discussão mais ampla que o mobiliário urbano possa ser melhor adequado à população e ao espaço público que se insere. palavras-chave: mobiliário urbano; espaço público; Porto Maravilha; Rio de Janeiro. Introdução Muito recorrente a partir das críticas ao movimento modernista, a escala humana como diretriz principal geradora da qualidade do espaço urbano vem fundamentando diversos projetos urbanísticos ao redor do mundo. Mourthé (1998) aponta que foi a partir da década de 1990 que requalificação dos espaços públicos foi associada à intervenções urbanísticas pensadas entre designers, arquitetos, cientistas sociais e governantes. Isso demonstra que todos os elementos urbanos, em suas variadas escalas, contribuem para a formação e requalificação dos espaços. O mobiliário urbano, sendo complemento da urbanização (MOURTHÉ, 1998) e suporte das atividades urbanas, estreita a relação entre o cidadão e o espaço e caracteriza sua leitura de um determinado espaço público. A utilização de escala perceptiva proporcional aos indivíduos, ou dimensão humana, segundo Gehl (2010), é o caminho para atingir uma cidade viva, segura, sustentável e saudável. Como em Gehl a escala humana abrange elementos arquitetônicos de diferentes escalas, vemos que um dos elementos através dos quais essa relação se dá é o mobiliário urbano. Ainda que não a nomeassem como "dimensão humana", Carmona et al. (2003) aproximam-se dessa grandeza ao discorrer sobre a "dimensão visual", dentre as seis dimensões do design urbano por eles observadas, como uma grandeza estética e também perceptiva e incluem nessa dimensão o mobiliário urbano. Indicador de um espaço urbano de qualidade, o mobiliário urbano é, além disso, um dos elementos da dimensão visual que contribuem para a identidade do espaço urbano (CARMONA et al., 2003) . O mobiliário urbano deve ser visto como um conjunto de objetos instalados que se associam à paisagem urbana pois são objetos que devem atender às necessidades do cidadão, como um prestador de serviços. Dentro de um sistema de intervenções que compõem o projeto urbano, o mobiliário urbano é um elemento que deve ser produzido em favor da contribuição à qualidade dos espaços públicos. As definições que cercam o conceito de mobiliário urbano, no entanto, são as mais variadas. De acordo com as definições apresentadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), na NBR 9283/1986 -Mobiliário Urbano, podem ser denominados mobiliários urbanos "todos os objetos, elementos e pequenas construções integrantes da paisagem urbana de natureza utilitária ou não, implantados mediante a autorização do poder público, em espaços públicos e privados". A norma ainda apresenta categorias nas quais os mobiliários urbanos são classificados. (COLCHETE FILHO, 2000) . Além da variedade das denominações, a própria expressão "mobiliário urbano" pode, segundo Creus, trazer uma compreensão inadequada e a restrição da função do mobiliário urbano ao ato de decorar a cidade. Seguindo esta lógica, o autor acredita que as funções desses elementos urbanos vão além de funções meramente decorativas. Eles podem ser designados como objetos utilizados e integrados na paisagem urbana, devendo ser compreensíveis para os cidadãos. O seu uso, integração e compreensão são os conceitos básicos para avaliar todo o conjunto de objetos que estão nos espaços públicos da cidade. (CREUS, 1996) . No que diz respeito à função do mobiliário urbano, Mourthé acrescenta a interação direta entre usuários e espaços. Segundo a autora, o mobiliário urbano possui grande importância na qualidade de vida dos espaços públicos, em uma relação interativa com os usuários. Mesmo que o mobiliário urbano pertença a uma menor escala, a identificação de um espaço pelo indivíduo também se dá por eles e não apenas pelas edificações e pela disposição urbana. A autora aponta também as diferenças culturais que podem ser notadas no mobiliário urbano, em fatores que provém tanto da cultura local quanto de padrões extraterritoriais nos espaços públicos, que pertencem a uma ordem cultural, histórica e climática. (MOURTHÉ, 1998) . Os elementos de mobiliário urbano, desta forma, acompanham a evolução das cidades e de seus espaços públicos, passando por mudanças e adaptações, muitas das vezes transformando estes espaços em atrativos sociais, influenciando usos e funções em um contexto sociocultural e histórico específico. Através da vivência em lugares urbanos, os habitantes experimentam sensações, tensões, transformações e interferências que frequentemente exercitam sua compreensão sobre o ambiente (MONTENEGRO; ELALI; GOMES, 2011). Assim, as características que o mobiliário urbano adquiriu diante de uma nova percepção da cidade foram incorporadas em tradução de novas funções e tipologias, inclusive como surgimento de equipamentos que não existiam, como aponta Montenegro (2005) , e a obsolescência de outros.O mesmo autor acredita que o mobiliário urbano vem adquirindo ao longo dos anos uma maior importância justamente pelo papel que desempenham no contexto das cidades modernas, tornando-se
doi:10.5151/cid2017-60 fatcat:2lyilcbemjhmxek3nrl6gckst4