Escrita ação, escrita corpo

Lia Duarte Mota
2020 Eutomia  
Em A hora da estrela, último romance de Clarice Lispector, de 1977, o narrador Rodrigo S.M afirma que da junção de palavras que formam frases surge um sentido secreto, e que ele escreve com o corpo. Esse sentido secreto parece estar próximo do que Jacques Rancière chama de política da arte. Para o teórico, a arte possui uma política própria, que concorre com a disciplina política e que é anterior à vontade dos artistas. Desse modo, a arte não produz conhecimento para a política, mas sim
more » ... s, uma experiência específica, fruto do engendramento entre o visível e o não visível, o dizível e o não dizível. O que vale ressaltar é que a tensão imposta não se resolve, ela é parte do espaço sensível comum. Trata-se, então, de pensar como esses corpos estão imbricados na escrita, partes de um ato que se dá no indecidível da política da arte. A literatura envolve o corpo e não deve falar, especificamente, sobre situações políticas para ser política, não deve falar, especificamente, sobre a existência ou a construção/ ocupação humana do mundo para ser considerada pensamento. A escrita é política ao embaralhar gêneros, discursos, assuntos, línguas, lugares. A proposta deste trabalho é pensar este corpo presente no romance de Clarice Lispector como ação política.
doi:10.51359/1982-6850.2019.244668 fatcat:7rtnx4vqsvagjksdci7wfqvzhy