Para uma antropologia histórica dos povos indígenas: reflexões críticas e perspectivas

João Pacheco de Oliveira, Pablo Quintero
2020 Horizontes Antropológicos  
Este número reúne trabalhos de pesquisa que se situam no cruzamento entre, de um lado, uma modalidade de fazer antropológico aqui referida sinteticamente como antropologia histórica, e, de outro lado, os povos indígenas, pensados como sujeitos políticos portadores de direitos e de protagonismo. Antropologia e história constituem exercícios voltados para uma profunda compreensão do Outro, ou seja, de uma forma de existência social bem distinta daquela do narrador e de seu público, seja em termos
more » ... geográficos ou cronológicos. Uma separação entre elas, remetendo a domínios e métodos distintos, não pode ser encontrada nas obras de muitos dos seus mais clássicos fundadores, como Lewis Morgan, Max Weber, Franz Boas, Marc Bloch ou Fernand Braudel. Essa ruptura veio a ocorrer somente em um momento seguinte, quando esses conhecimentos ingressaram nos espaços universitários e precisaram cristalizar-se em disciplinas distintas (Lander, 2000) . Para uma história da ciência positivista se trataria apenas de movimentos de diferenciação e especialização próprios a todo processo de "evolução social". Mas para uma perspectiva crítica é preciso destacar que essa incorporação às universidades se deu sob a hegemonia das ciências naturais e segundo os pressupostos epistemológicos que as instituíram. Nesse sentido as preocupações caminham sobretudo para a definição de métodos que fossem compatíveis com as ciências mais reconhecidas. Isso ocorre também em paralelo ao aperfeiçoamento de dispositivos de controle e vigilância na sociedade capitalista durante um acelerado processo de expansão colonial e de disputa de mercados. É em decorrência desse cenário que, como nos lembra Talal Asad (1973), as ciências sociais se desenvolveram como disciplinas universitárias fabricando as suas identidades de maneira fragmentária e contrastiva. Com Malinowski (1978) táticas e estratégias de investigação tornaram-se emblemas identitários. O trabalho de campo, o corte sincrônico e o uso da língua nativa passaram a ser tidos como a marca da pesquisa antropológica. A fonte de informação confiável tornou-se apenas o registro direto feito por um observador treinado: o etnógrafo, que assegurava assim para si o monopólio do saber científico sobre as sociedades primitivas (Tuhiwai Smith, 1999) . Em paralelo se distanciava radicalmente dos historiadores ao minimizar a importância dos arquivos e das reconstruções do passado.
doi:10.1590/s0104-71832020000300001 fatcat:yvczjs6y4ffotir2y7hadfikaq