Políticas de nacionalidade e políticas de imigração na França
Rossana Rocha Reis
1999
Revista Brasileira de Ciências Sociais
França, outono de 1989. Três meninas na cidade de Creuil são proibidas por seus professores de ir à escola portando os véus que as identificam como muçulmanas. Em pouco tempo, a discussão a propósito da pertinência ou não da proibição do véu toma conta de todo o país e provoca veementes manifestações em todos os setores da vida política e cultural francesa. O "affaire du foulard", como ficou conhecido, à medida que se foi desenvolvendo e envolvendo cada vez mais as altas esferas da política
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... onal, e até mesmo as relações da França com os países do mundo islâmico, foi revelando muito sobre a natureza da identidade nacional francesa, e como ela se constrói em relação ao outro, representado pelo estrangeiro. 1 No caso citado, nós temos, simbolicamente, uma confrontação entre a identidade nacional francesa e o outro. A decisão de permitir ou não o uso do véu islâmico resume em si a maneira, ou as maneiras, como a nação francesa constrói a sua identidade. Atualmente, a relação nacional/estrangeiro adquiriu uma imensa importância na França, a julgar pela freqüência com que ela é discutida nos meios de comunicação, nas ruas, nos meios políti-cos, pela relevância que ela adquire nas vésperas de eleições, pela imensa quantidade de leis, circulares e decretos que concernem a essa relação, passando até por uma reforma no código de nacionalidade, a primeira desde 1945. Não que a França não tenha mais com o que se preocupar; afinal, o país passa por momentos difíceis desde o fim do período de crescimento econômico pós-Segunda Guerra, conhecido como "trinta gloriosos", enfrentando altas taxas de desemprego e baixas taxas de crescimento. No entanto, nenhum tema parece suscitar tantas paixões como a questão dos imigrantes e estrangeiros. De acordo com o tipo de discurso que se vem desenvolvendo dentro do país, até mesmo a questão do desemprego parece subordinada ao problema dos imigrantes. Na verdade, o "problema da imigração" é um termo muito restrito para abraçar a totalidade do problema francês; a dificuldade do Estado francês de controlar suas fronteiras e reduzir o número de imigrantes no país é apenas um dos aspectos dessa questão. O "outro", quando se discute a identidade, pode ser não só o imigrante, como o francês naturalizado ou os franceses de nascimento. De fato, o grande problema, já que estamos falando de identidade, é definir o que é ser francês.
doi:10.1590/s0102-69091999000100007
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