PERSISTÊNCIA E RELEVÂNCIA DOS ACCRUALS: EVIDÊNCIAS DO MERCADO DE CAPITAIS BRASILEIRO
Augusto Cunha Silva Filho, Márcio André Veras Machado
2013
Revista de Educação e Pesquisa em Contabilidade
REPeC -Revista de Educação e Pesquisa em Contabilidade, ISSN 1981-8610, Brasília, v. 7, n. 4, art. 4, p. 387-406, out./dez. 2013 388 Introdução Dentro dos estudos em finanças, investigar o comportamento do mercado de capitais foi tema de diversos trabalhos. O primeiro trabalho nessa linha, possivelmente, foi realizado por Bachelier (1900), que investigou a possibilidade de especulação nos mercados de capitais franceses. Contudo, foi a partir, principalmente, da década de 50 que os estudos sobre
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... o comportamento dos mercados de capitais desenvolveu-se cientificamente, quando estudiosos, como Markowitz (1952 ), Sharpe (1964, entre outros, incorporaram modelagens matemáticas e estatísticas ao estudo das finanças. Com base nesses modelos matemáticos e estatísticos e no elevado grau de desenvolvimento teórico da época, surgiu a hipótese de mercados eficientes (HME), proposta por Fama (1970). De acordo com essa hipótese, o mercado seria considerado eficiente se refletisse rapidamente qualquer informação nos preços das ações, o que impossibilitaria auferir ganhos anormais (Fama, 1970) . As verificações empíricas realizadas nas décadas de 70 e 80 tentavam sustentar a hipótese de mercados eficientes (HME), e a conclusão a que se chegava era de que o mercado se mostrava eficiente (Sewell, 2011). Contudo, a partir de meados dos anos 80, em virtude do desenvolvimento da computação, das técnicas estatísticas cada vez mais sofisticadas e do aperfeiçoamento dos bancos de dados, muitas evidências surgiram, refutando as premissas da HME (Costa & Neves, 2000) . Tais pesquisas evidenciaram comportamentos anormais consistentes nos retornos dos títulos, o que é totalmente inconsistente com a eficiência de mercado. Essas estratégias de investimentos com base nos comportamentos dos retornos das ações foram denominadas de anomalias. Paralelamente ao desenvolvimento de novas técnicas estatísticas, muitos pesquisadores, nas últimas décadas, procuraram investigar a existência de anomalias sistemáticas detectadas na formação de preços das ações. Assim, detectaram estratégias de negociação que produziam retornos anormais positivos e consistentes em longo prazo. Entre elas estão: fator tamanho (Banz, 1981) ; índice book-to-market (Stattman, 1980) ; fator momentum (Jegadeesh & Titman, 1993) e o fator liquidez (Amihud & Mendelson, 1989) . Em meio a esses achados, descobriu-se, pioneiramente, no mercado norte-americano, a possibilidade de obtenção de retornos anormais por meio de uma estratégia de negociação baseada em accruals. Em Contabilidade, os accruals representam a diferença entre o resultado contábil e os fluxos de caixa das atividades operacionais. De fato, os accruals são ajustes feitos no resultado contábil de alocações que não se transformaram em dinheiro no período corrente (Lustosa, Fernandes, Nunes & Araújo, 2010; Sloan, 1996) . Sloan (1996) foi o primeiro pesquisador a examinar a relação entre accruals e retorno acionário, propondo uma relação positiva entre o retorno anormal e empresas com baixo nível de accruals, refutando a hipótese de mercados eficientes (HME). O autor demonstrou que os investidores não avaliam corretamente informações sobre os accruals nos preços das ações, possibilitando, assim, a obtenção de retornos anormais por intermédio de uma estratégia de negociação baseada na magnitude dos níveis de accruals das entidades. Para Sloan (1996), em virtude de os accruals serem menos persistentes em relação aos fluxos de caixa, os investidores não levavam em consideração a relevância das informações contidas nos accruals sobre os lucros futuros, uma vez que superestimavam os accruals e subestimavam os fluxos de caixa, ao formar suas expectativas futuras sobre os lucros, ou seja, os investidores não percebiam o diferencial de persistência dos accruals e fluxos de caixa (Sloan, 1996) . Assim, ao superestimar a persistência dos accruals e subestimar a persistência dos fluxos de caixas na formação de suas expectativas, os investidores subestimam os lucros futuros das empresas com baixos níveis de accruals e superestimam os lucros futuros das empresas com altos níveis de accruals. Consequentemente, tal situação leva ao mau apreçamento das ações, pois o lucro é considerado variável-chave na previsão futura dos retornos ou preços das ações, assim como para medir performance em contratos de gestão e de dívidas (Chan, Chan, Jegadeesh & Lakonishok, 2006) . Devido a esse erro de precificação, retornos anormais podem ser obtidos, investindo em um portfólio constituído de empresas com baixos níveis de accruals, uma vez que seus lucros futuros são subestimados, tornando os preços das ações atuais subvalorizados.
doi:10.17524/repec.v7i4.985
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