Os autores respondem

Stella Regina Taquette, Wilza Vieira Villela
2017 Ciência & Saúde Coletiva  
Gostaríamos de agradecer aos nossos debatedores, que com seus comentários enriqueceram nossas reflexões sobre a divulgação de investigações de cunho qualitativo em saúde, além de aportar elementos importantes à análise apresentada no artigo em discussão. Os três debates se afinam no reconhecimento de que a saúde e a doença não são condições exclusivamente biomédicas. Para estas últimas, investigações baseadas tão somente na quantificação e generalização dos achados a partir da lesão, talvez
more » ... em suficientes. Ao assumir a saúde e a doença como experiências sociais complexas que atravessam a vida de sujeitos, histórica e culturalmente situados, os debatedores sinalizam a importância de estratégias de pesquisa que busquem melhor captar essas dimensões. As análises da nossa discussão sobre limites implícitos ou explicitos à publicação de artigos baseados em estudos qualitativos em revistas acadêmicas da área de saúde sem dúvida contribuem para a melhor compreensão da complexidade inerente aos fenômenos humanos relacionados à saúde. Ademais, incitam o diálogo entre pesquisadores da área de diferentes origens e formações. Assim, Minayo inicia seu debate retomando a questão da cientificidade do dado qualitativo, tão questionada por quem defende que a objetividade da ciência é sinônimo de neutralidade e matematização. A referência a pensadores que postulam o mundo vivido como produto da ação e interação humanas é trazida como base epistemológica da cientificidade de dados gerados por meio de métodos qualitativos. Este recurso também fundamenta a possibilidade de generalização, outro pilar da ideia de cientificidade nas sociedades contemporâneas. Arguindo que generalização não é o mesmo que representatividade estatística, a autora lembra que qualquer experiência humana é tornada possível a partir da incorporação, pelos sujeitos, do conjunto de símbolos, signos e significados que conferem sentido aos fatos e objetos do mundo, permitindo que a experiência aí se inscreva. Nesta questão da generalização, Minayo e França Júnior convergem, pois ambos concordam que as interpretações dos estudos qualitativos podem ser generalizadas, mas com cuidado e rigor teórico-metodológico. Fugindo do debate estreito que opõe de modo valorativo as abordagens qualitativas às quantitativas, Minayo finaliza o seu debate tocando num ponto sensível e eventualmente incômodo: a qualidade dos manuscritos. Trazendo sua vasta experiência de editora, a autora lista alguns dos principais equívocos que concorrem para que alguns artigos derivados de pesquisas ditas qualitativas sejam recusados, mesmo por periódicos que não apresentam restrições prévias à publicação de manuscritos baseados nesta abordagem. Considerando a listagem apresentada gostaríamos de levantar a hipótese de que talvez parte destes equívocos se deva à incompreensão, por parte destes autores, do que seja ciência, dos fundamentos teóricos que garantem cientificidade à pesquisa qualitativa e ainda do significado de fazer uma pesquisa e publicar seus resultados. Vale também acrescentar a hipótese, talvez não menos relevante, da pressão sobre os programas de pós-graduação no sentido da publicação dos trabalhos de seus alunos e a ilusão de que um estudo qualitativo é mais fácil e mais barato de ser conduzido, como elemento que induz a submissão de trabalhos ditos qualitativos, mas que na realidade não atendem aos requisitos de um trabalho acadêmico. Outra suposição para a falta de qualidade dos manuscritos se deve a lacunas na formação em ciências humanas e sociais de grande parte dos pesquisadores do campo da saúde, principalmente aqueles que são oriundos de cursos predominantemente técnicos, como os de medicina, odontologia, farmácia, entre outros. Coincidindo com Minayo, França Jr também vai questionar o aspecto da qualidade. No entanto, é pela arguição de uma das premissas apresentadas em nosso artigo, o tamanho do manuscrito, que o debatedor articula a sua contribuição. Ivan nos lembra que o argumento de que a limitação do tamanho do artigo não deve a priori ser considerada como uma barreira à publicação de artigos qualitativos. Relembrando as vantagens da concisão da escrita, mesmo no texto literário, Ivan nos remete à reflexão entre uma certa concepção de objetividade que não se confunde com neutralidade, materialidade ou mensuração, e sim à possibilidade de objetivação das ideias e experiências do sujeito. De fato, a possibilidade de objetivação, por meio da linguagem, dos fenômenos ditos subjetivos é o que nos humaniza e nos insere na cultura.
doi:10.1590/1413-81232017221.28572016 pmid:28076525 fatcat:plywti4455bwbli3uua6yn4jbu