Revendo os estigmas tiroidianos na Síndrome de Turner

Magnus R. Dias da Silva
2007 Arquivos brasileiros de endocrinologia e metabologia  
A S RAZÕES GENÉTICAS PELAS quais tantas pacientes com Síndrome de Turner (ST) sofrem de disfunção tiroidiana autoimune permanecem desconhecidas. O trabalho de Medeiros et al (1), neste fascículo, apontam para a correlação do discutível papel da ultra-sonografia (USG) de tiróide no diagnóstico e seguimento destes casos (estudados retrospectivamente) apesar da clara deficiência deste método de imagem para avaliar função tiroidiana. É imensamente curiosa a observação sugerida pelos autores de que
more » ... USG de tiróide foi o método mais sensível para detecção de disfunção tiroidiana na faixa etária pediátrica, correlacionando-se em especial com o achado de tiromegalia em 21/24 das pacientes estudadas. Os métodos de imagem não acrescentam na avaliação de função, exceto no nódulo com suspeita de hiperfunção. Vejo esta sugestão com bastante cautela e reitero a opinião de que assumir mais um estigma laboratorial tiroidiano ainda é muito cedo e inconsistente com os achados recentes da literatura médica. Pacientes com Síndrome de Turner apresentam incidência de disfunção tiroidiana, em especial a tiroidite de Hashimoto, maior do que a classicamente conhecida entre mulheres adultas (2). É importante ressaltar que outras cromossomopatias também apresentam maior propensão à disfunção autoimune de tiróide, como a Síndrome de Down. Não é também incomum outras doenças autoimunes associadas à cromossomopatia, tais como a artrite reumatóide, vitiligo, doença celíaca, diabetes, miastenia e hepatite (3). Em elegante estudo longitudinal, El-Mansoury et al (4). avaliaram 91 pacientes com ST comparadas com 228 mulheres aleatoriamente selecionadas da população normal e pareadas para idade e demonstraram uma constatação comum entre os mais diversos ambulatórios especializados do mundo, o de que 37% das portadoras da ST evoluíram com hipotiroidismo ao cabo de 5 anos. Surpreendentemente o estudo sueco não encontrou correlação dos achados de autoimunidade entre familiares de 1º grau dos indivíduos com ST com o hipotiroidismo diagnosticado. Esta observação reflete o quanto estamos distante de entender as causas genéticas possivelmente envolvidas. A monossomia 45X e/ou suas variantes mosaicas pode exercer um efeito permissivo à autoimunidade, embora essa hipótese ainda não esteja seguramente demonstrada cientificamente. Apesar desta predisposição às disfunções autoimunes clinicamente conhecida por todos nós, outros fatores de herança genética autossômica devem contribuir para a deflagração da doença. Ao contrário do que ocorre na situação de haploinsuficiência do gene SHOX (short stature homeobox), que pode explicar a maioria das desproporções ósseas, ou ainda, quando da associação da monossomia clássica 45X com a doença cardíaca congênita e a deficiência auditiva encontradas na ST (5). O estudo sueco não encontrou correlação entre a percentagem de células com cariótipo 45X determinado por FISH e o número de casos com disfunção tiroidiana. Além disso, valores positivos elevados de anticorpo anti-peroxidase tiroidiana (TPO) estavam igual-
doi:10.1590/s0004-27302007000300003 pmid:17546234 fatcat:eeoq3uidvvg2xdig3uac4oprzm