Um paladino da monarquia na imprensa republlicana

Antonio Arnoni Prado
2012 Remate de Males  
Perdida é para mim toda a esperança De volver ao Brasil; de lá me veio Um pugilo de terra: e nesta, creio, Brando será meu sono sem tardança... D. Pedro de Alcântara O jornal L'Independence Belge, de Bruxelas, informava a 2 de fevereiro de 1913 a chegada do novo ministro do Brasil na Bélgica, Gastão da Cunha, em substituição ao embaixador Oliveira Lima, que a notícia definia como um diplomata brilhante "que soube defender com patriotismo os interesses de seu país". "A partida desse eminente
more » ... omata ainda jovem -sublinha o jornal -será bastante sentida na Bélgica". E acrescenta, referindo-se ao destino do ex-ministro plenipotenciário que se retirava, que ele se encontrava "atualmente em viagem de conferências pelos Estados Unidos. Sobre as razões que levaram Oliveira Lima a deixar o cargo havia apenas uma carta publicada no Estado de S. Paulo de 12 de setembro de 1912 em que o ex-ministro explicava a um amigo que decidira pedir a sua aposentadoria "devido aos desgostos que lhe causaram alguns atos do ministério do Exterior". Aludia, com isso, ao convulso panorama político brasileiro dos últimos meses de 1912, quando a velha questão da restauração monárquica voltava a agitar o ambiente institucional da República. Na verdade, a questão de seus vínculos com a monarquia vinha desde os avanços da campanha civilista, em 1909-1910, quando Oliveira Lima se alinhou entre os maiores entusiastas da candidatura de Rui Barbosa à Presidência da República no pleito contra Hermes da Fonseca. Ainda na Bélgica, na Exposição de 1910 em Bruxelas, conheceu o príncipe D. Luiz de Orléans e Bragança, filho da princesa Isabel, que desde 1907 tentava articular com as bases do Diretório Monarquista do Rio de Janeiro uma ação conjunta que o levasse ao poder, ao qual era o primeiro aspirante desde a renúncia de seu irmão Pedro. Sobre o príncipe, que havia lançado em abril de 1909, pelo jornal O Estado de S. Paulo, uma ruidosa carta-manifesto que repercutiu no contexto das idéias civilistas então em marcha, Oliveira Lima publica em 1910, primeiro em Paris e depois em São Paulo, o artigo "Um príncipe brasileiro no pavilhão do Brasil em Bruxelas", no qual não apenas exalta o regime imperial, como também a figura magnânima de Pedro II. 1 No ano seguinte, pronuncia na Sorbonne uma série de conferências depois recolhidas no volume Formation historique de la nationalité bresiliènne, nas quais, além de reafirmar o caráter próspero e integrador do regime monárquico, celebra a grandeza do Imperador e a excelência de seu caráter. À publicação desse artigo, seguiu-se a coordenação de uma campanha, iniciada pelo próprio Oliveira Lima, com vistas a revogar o banimento No dia 9 de dezembro de 1912 o jornal O País noticiava o desembarque de Oliveira Lima e sua esposa, dona Flora, no cais Pharoux, procedentes do Velho Mundo. Depois de aludir ao êxito das conferências que o ex-ministro proferira em Paris, Bruxelas e Nova Iorque e que segundo a nota demonstravam "o grande amor que ele votava à sua Pátria", diz o jornal que Oliveira Lima era "um verdadeiro embaixador do Brasil, não apenas perante um governo ou uma corte, mas perante a civilização ocidental". Sua presença no país nesse momento de graves atribulações políticas reacendia -segundo a nota -o compromisso com a missão histórica que s. exa. não poderia deixar de cumprir como "um cuidadoso cultor do passado procurando, como todos nós, consolar-se talvez das agruras do presente, com a contemplação da grandeza iniludível da nossa historia". Por ser ele um "apaixonado observador de quanto de nobre possuímos no nosso passado" -acrescenta o jornal que Oliveira Lima podia ser considerado como um soldado da restauração, não apenas porque conhecia de perto a força e a energia da nossa raça, mas também porque sabia que um povo, "quando tem uma história feita de glórias nobremente conquistadas, não pode deixar de cumprir a missão histórica que o destino lhe reservou". A Gazeta de Notícias deu em destaque a presença de diversos amigos que foram receber o casal a bordo do paquete Vazari, entre eles o barão Homem de Melo, o poeta Augusto de Lima, o ministro Barros Moreira, o crítico José Veríssimo, além de Sílvio Romero filho que, representando o ministro Lauro Muller, levou flores a dona Flora, momentos antes de a comitiva seguir para o Hotel dos Estrangeiros, onde o casal costumava se hospedar. Na saída, indagado pelos repórteres, Oliveira Lima afirmou não saber ao certo qual a sua verdadeira condição de momento, "se a de ministro aposentado ou em disponibilidade". Tinha apenas certeza de que, depois do Rio de Janeiro, seguiria para São Paulo e em seguida para Pernambuco, onde pretendia descansar. Pouco antes de se retirar, ainda pediu notícias de Rui Barbosa, de cujo último discurso sobre o Governo Provisório acabara de tomar conhecimento.
doi:10.20396/remate.v24i2.8636075 fatcat:zrptbrvmuzh7jivcavm7valvuu