Do dualismo ao ornitorrinco: entrevista com Francisco de Oliveira

Marcelo Siqueira Ridenti, Flávio da Silva Mendes
2012 Caderno CRH  
ENTREVISTA Marcelo Ridenti: Nesta entrevista, nós estamos interessados em discutir sua obra. Chico de Oliveira: Que obra? Marx um dia perguntou: "que obra?" (risos). Flávio Mendes: Na outra entrevista à Margem Esquerda, você falou a mesma coisa. Se não for a obra, pelo menos a trajetória. Chico: Trajetória é melhor, eu me reconcilio melhor com essa ideia do que com a de obra. Eu tenho um texto importante, dos anos 1970, que é Crítica à razão dualista. Os outros não tiveram tanta importância.
more » ... vio: Você tem dois artigos anteriores que foram publicados na Revista Civilização Brasileira. Um de 1965, que é uma crítica ao programa econômico do Castello Branco, e um de 1966, sobre planejamento. Minhas perguntas são sobre esses dois textos, duas perguntas na verdade: Eu queria que você falasse sobre os temas deles. Quais eram as propostas desses dois artigos? E, também, como você chegou à Civilização Brasileira? Chico: Nessa época, eu fiquei muito no Rio de Janeiro. Eu estava, na sequência do golpe, saindo de Recife e fiquei no Rio de uma forma bastante provisória, sem emprego, fazendo bicos, e me aproximei do grupo que o Ênio Silveira reunia. Era um grupo de esquerda, majoritariamente do Partidão [Partido Comunista Brasileiro], porque ele próprio era militante do Partidão. E eu me aproximei daquele grupo. Foi quando ele estava lançando a Revista Civilização Brasileira, e eu fiz o primeiro artigo, que foi sobre o Castello Branco. Foi escrito como uma peça de oposição à ditadura. Ele tem um título farsesco, porque diz que não vai dar certo e deu (risos). Fazia parte de uma frente de oposição, que era muito louvável, contra o Roberto Campos, era o mentor, o Bulhões... A gente queria cutucar o cão com vara curta. Esse é o contexto em que foi produzido. Não tem grande coisa. Marcelo: Esse pessoal da revista se reunia com frequência? Chico: Não se reunia com frequência, não era uma Em 2012, o ensaio "Crítica à razão dualista", de Francisco de Oliveira, completou 40 anos. Nesta entrevista, o sociólogo pernambucano radicado em São Paulo expõe algumas das referências teóricas e políticas que o levaram à elaboração daquele texto clássico. Discute, também, outros trabalhos importantes ao longo de sua trajetória intelectual, desde os artigos ainda inspirados pelo dualismo de Celso Furtado, nos anos 1960, até a criativa metáfora do ornitorrinco, à qual recorre para compreender o Brasil atual. Nesse percurso, revisita trabalhos dedicados à região nordeste, aos desafios da redemocratização da sociedade brasileira, à trajetória dos intelectuais do país, ao Partido dos Trabalhadores e ao avanço do neoliberalismo, já nos anos 1990. No final, não se esquiva de realizar comentários sobre a atual conjuntura nacional. Esperamos que este material contribua para o debate sobre sua obra e inspire, mais uma vez, reflexões sobre a realidade brasileira.
doi:10.1590/s0103-49792012000300014 fatcat:xj37uf7utjcgrjdelfjbsrvndm