David Viñas: um escritor de cinema
Adriana Bocchino
2012
Remate de Males
Articular historicamente algo passado não significa conhecê-lo "como ele efetivamente foi". Significa captar uma lembrança como ela fulgura num instante de perigo. Walter Benjamin: "Teses sobre filosofia da história". O cinema não é fotografia em movimento, não é literatura, tampouco teatro filmado; sabe-se, é cinema. No entanto, muito se tem discutido sobre as relações entre literatura e cinema, discussões estas que acabaram tendendo para um ou outro termo da comparação ou procurando um meio
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... rmo. Para além das eventuais conclusões a que se poderia chegar, o fato é que, às vezes, assistimos filmes que se aproximam muito da literatura -sobretudo aqueles filmes que se distanciam dos propósitos literários -, e que, por vezes, lemos livros, romances ou contos, que já constituem em si mesmos uma espécie de filme. Os livros da David Viñas me surpreenderam quanto a este último aspecto, numa releitura feita recentemente. Trata-se de um autor de literatura argentina reconhecido no país e no exterior, que escreveu especialmente para cinema, detalhe que não é muito levado em consideração na atualidade 2 . Lido como escritor da década de 60 dentro do sistema da literatura argentina; lido nos anos 70 como modelo de escrita do exílio; apreendido pela crítica como exponente de um realismo problemático -aspecto discutido por mim, que propus a hipótese de um Viñas mais alegorista que realista -, o fato é que nunca antes havia me detido num traço que, agora, me salta aos olhos como o mais evidente: muitos de seus romances e contos, não apenas o romance e os contos que foram efetivamente adaptados para o cinema, possuem uma forma que aponta diretamente, em função das formas de produção da escrita, à produção cinematográfica. Sem dúvida, isto se vincula precisamente com essa "forma" à qual me referi ao tratar do modo de produção característico de Viñas, forma que o separa, na discussão acerca da classificação estética de sua obra literária, tanto do realismo mais simples como do realismo mais matizado; refiro-me ao modo de produção alegórico, resumido com precisão e poesia, nas suas formas e no seu alcance, na epígrafe que encabeça este artigo. Uma explicação sobre a alegoria e a montagem em Viñas É evidente que ao falar de alegoria não me refiro à alegoria em termos tradicionais -isto é, medievais ou renascentistas-, mas à alegoria postulada por Walter Benjamin, que não somente se debruçou sobre o conceito ao tratar drama barroco alemão (no estudo sobre o Trauerspiel), como expandiu a noção ao explicar as produções das vanguardas his-
doi:10.20396/remate.v25i2.8636069
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