Comoumsótrabalho - sobre os projetos de escala geográfica de Nelson Felix [thesis]

Gabriela Kremer da Motta
Comoumsótrabalho (Asasinglejob) -about the geographic scale works of Nelson Felix - investigates a specific set of works by the artist, precisely those whose construction involves extreme geographic dislocation, a dilated temporal experience and the premise of continuous interconnection between all of the artist's works. Marked by the constructive rigor and by a series of symbolic determinations, Felix's production turns to organic forms, planetary cycles, music and written poetry, in a game of
more » ... equivalences and reverberation that presents itself in a stellar way, simultaneously aware of and unsubordinated to the contemporary aesthetic paradigms. Thus, starting from reflections that problematize the ambivalent relations between the work of Nelson Felix and the tradition of sculpture, the research finds, in the processes of construction of projects by the artist, the concepts that will guide this discussion. These reflexes basically rely on continuation of works, on the super-human temporality to which they are submitted and on the monumental invisibility of the work. Sumário Prólogo [17] Considerações iniciais -pontos de partida [21] Capítulo 1 -Um nome para o que não tem nome [35] 1.1 Um começo de caminho: do plano do desenho para o espaço da escultura [43] 1.2 Ordem e acaso [51] (A) Seção parêntesis: Visto Bom [63] 1.3 A cidade de Camiri: encontro e orientação em Concerto Para Encanto e Anel [69] 1.4 Camiri sairá pelo mundo: a obra é sujeito [75] 1.5 Última parada: Cavalariças [83] Capítulo 2 -O sentido da forma [93] 2.1 O espaço entre: 4 Cantos (2004-2008) [103] 2.2 Matéria e acontecimento [115] (B) Seção parêntesis: O samba da minha terra [127] 2.3 Um tempo contínuo enquanto sua verdade [131] 2.4 A monumental invisibilidade da obra [139] Capítulo 3 -A cartografia de uma condição poética [161] 3.1 Excessos para um esvaziamento -4 Cantos (Portugal) e Verso [171] (C) Seção parêntesis: O espelho de Leiris, a ilha de Shakespeare, as maravilhas de Lewis [187] 3.2 A construção da Casa Térrea: abrir a porta novamente [193] Considerações finais -uma constelação [201] Epílogo [207] Fontes Bibliográficas [211] Apêndice: entrevistas [221] América 3 . Além dessas obras, ainda abordarei o trabalho Verso 4 [2008-2013], que engloba a obra de mesmo nome, apresentada em São Paulo, e o trabalho 4 Cantos [2008], realizado em Portugal, homônimo daquele citado anteriormente 5 . Convém lembrar que, em toda sua trajetória, o artista nunca deixou de produzir desenhos e esculturas no sentido tradicional desses termos. No entanto, ainda que tais obras apresentem qualidades inegáveis, elas só serão abordadas quando tal expediente for relevante para as análises dos seus projetos de escala geográfica ou para a discussão de aspectos relativos ao seu processo artístico. Em 1980, quando Felix fez sua primeira exposição individual, na galeria do marchand carioca Jean Boghici, todos os seus trabalhos -desenhos feitos em aquarela -foram imediatamente vendidos. O "sucesso" daquele momento provocou no artista uma mudança determinante tanto na sua obra como no seu estilo de vida. 3 A impossibilidade de circunscrever cada um desses projetos é uma premissa de suas características conceituais. Longe de querer transpor essa dificuldade, esta tese busca investigar como tais premissas condensam-se em suas obras, contribuindo para a singularidade do trabalho de Felix na produção contemporânea. De todo modo, no decorrer do trabalho o entrelaçamento entre tais projetos, bem como suas implicações, deverão revelar-se de forma mais clara. 4 A descrição dessa obra existente no site do artista diz: Verso (2008-2013) é uma obra realizada em dois lugares distintos, que se rebatem e assim se complementam: 4 Cantos (Portugal, 2008) e Verso (São Paulo, 2013). O trabalho aborda, primeiramente, um pensamento sobre o espaço, na sua estrutura mais simples -os cantos, o centro e o verso. Depois, na relação ambígua que existe na língua portuguesa entre as palavras canto e verso, ora com sentido espacial, ora com sentido poético. A primeira parte, 4 Cantos, prima pela relação espacial; a segunda, Verso, pela poética. Em 4 Cantos, o artista viajou por Portugal, aos quatro extremos do país, num caminhão munck carregado com quatro blocos cúbicos de pedra. Em cada canto, o artista colocava as pedras no solo e as desenhava. No último extremo, este em espaço interno, direcionou os blocos contra os cantos das paredes e os fixou com oito ponteiras de bronze, onde estavam inscritos os oito versos do poema Casa Térrea, de Sophia de Mello Breyner. Verso nasce da observação de que a cidade de São Paulo, o principal centro brasileiro, encontra-se equidistante e sobre uma linha imaginária que liga duas pequenas ilhas, uma no Oceano Pacífico e outra no Atlântico. O artista viaja às duas ilhas, os dois versos criados pela estrutura poética do trabalho no globo terrestre. Nelas, olha na direção de São Paulo, e finca no solo três peças de bronze, que constituem as três partes da letra A. Uma homenagem ao poeta catalão Joan Brossa, através de um dos seus poemas intitulado Desmuntage. Disponível em: www.nelsonfelix.com.br . Consulta em: 14/05/2014. Em São Paulo, a exposição do trabalho acontece em dois lugares: no Instituto Tomie Ohtake, onde são expostos uma série de desenhos feitos no processo do trabalho, uma flauta de mármore vazada pela palavra canto e duas projeções nas quais se vê uma imagem do artista realizando as ações nas ilhas; e na galeria Millan, local em que a obra formaliza-se na apresentação de uma exposição com grandes anéis em mármore, estacas de latão, ponteiras de cobre, desenhos e fotografias. Ele afirma: Percebi que se eu seguisse aquele caminho eu ia virar um artista 'pop'. Fui morar no mato, onde vivo até hoje, parei de tomar drogas, virei vegetariano, virei minha vida toda. Decidi que se era isso que eu queria, ser artista, ia ser a sério. Eu poderia ter construído outra coisa, mas construí por aqui e foi um caminho muito árduo 6 . Se, para Wilson Coutinho, no princípio, os desenhos de Felix eram irônicos e carregados de humor 7 , é de se notar que mesmo aí já se podia perceber o interesse do artista em produzir uma obra que transcendesse o lugar controlado do sistema da arte. No texto que acompanhava tal exposição, ocorrida na galeria de Boghici, Felix apóia-se em artigos do historiador de religiões Mircea Eliade e do poeta e ensaísta Octavio Paz para desenvolver uma reflexão, por um lado, sobre a permanência de uma religiosidade na arte e, por outro, sobre a crise das vanguardas 8 . Referindo-se ainda à meditação Zen, à prática da Yoga e à relação entre atividade artesanal e conceitual, Felix levanta uma série de questões que se tornariam indissociáveis de sua prática artística. Como assegura Glória Ferreira, "Da Cor do Amarelo" introduznos ao universo de suas reflexões, opções éticas, espirituais e estéticas, que até hoje informam sua práxis 9 . É ainda na década de 1980 que Felix começa a desenvolver dois importantes projetos, que dariam o tom -e o tempo -da sua produção mais relevante: a Série Gênesis e o já citado Cruz na América, cujos primeiros esboços são de 1985. O projeto da Série Gênesis, também iniciado em 1985, previa a introdução de materiais nobres em organismos vivos. Em um dos casos, ainda não realizado, a ideia é 6 Entrevista em 13/09/2010. Ver apêndice.
doi:10.11606/t.27.2016.tde-12012016-115443 fatcat:shkwepzncvffpjso6k2u4bowoe