Composição de quadros nas anotações de viagem de Flaubert e Delacroix
Lúcia Amaral, Oliveira Ribeiro
unpublished
1 Flaubert tem 27 anos quando parte para o Oriente com Maxime Du Camp em outubro de 1849. Ainda não havia publicado nenhum romance. Sua correspondência e anotações da viagem constituem uma espécie de laboratório de formas e modos de escrever que, depois, com mudanças, ele integra em romances, retomando procedimentos, estruturas, sintaxe e temas impregnados de sua experiência no Oriente. Da reunião de fragmentos sem as costuras de um enredo emerge o interesse por esse material, corpus
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... o para o estudo da escritura de Flaubert. Sem uma estrutura organizadora retrospectiva, sem os inúmeros planos e roteiros que depois vão marcar seu modo de escrever romances, suas anotações da viagem constituem elaborações do que é central no seu estilo: a produção de imagens 2 e cenas. Os diversos fragmentos de textos do Oriente convocam a imaginação visual do leitor produzindo um efeito de álbum de imagens. As anotações se sucedem em ordem cronológica e acompanham seu deslocamento no espaço. Informações sobre o percurso, tais como localização, data, horário de partida e chegada funcionam como base para a continuidade do ato de escrever ao longo dos dias. São frequentes as descrições de cores, formas de montanhas e do céu, especialmente ao pôr do sol. Em sua observação da natureza, Flaubert se insere em uma prática de educação do olhar que associa olhar físico e poético; criar imagens se relaciona ao exercício de organizar elementos da ordem do sensível. Flaubert escreve os textos do Oriente com formas plásticas. Ele se detém na descrição de luminosidade, variações de tons-explora elementos figurativos da paisagem e formas abstratas, por vezes com padrões geométricos, como linhas coloridas no céu. De diferentes maneiras, ele representa a percepção de fenômenos da luz, questão que acompanha descobertas da ciência no século XIX e que atravessa, de maneira muito particular, a reflexão estética de pintores, na época. A representação do espaço é um ponto de intersecção na arte de escritores e pintores que viajam. Ao abordar o Oriente de Flaubert, Isabelle Daunais propõe que o espaço não existe para ele como realidade referencial e sim como geometria, estilização. Trata-se de um espaço delimitado em que o visível depende das condições de observação.
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