A morte, os defuntos e os rituais de "limpeza" no pós-guerra angolano: quais os caminhos para pôr termo ao luto?

Rosa Maria Amélia João Melo
2008 Afro-Ásia  
Introdução A morte é um tópico que tem merecido alguma atenção da parte dos investigadores, nas mais diversas áreas disciplinares. Tem sido objeto de discussão em seminários e cursos e destacada através da imprensa, independentemente das suas causas. O seu impacto produz emoções; emoções complexas, às vezes, aparentemente contraditórias e, em geral, diferentes de cultura para cultura, ou seja, apesar de evidências de similitudes, nos diferentes contextos sociais, nas diferentes culturas, as
more » ... ormances rituais de morte variam, assim como as concepções sobre o mundo, a vida e a morte. Do mesmo modo, difere o tratamento dado aos cadáveres. 1 Conforme as culturas, alguns cadáveres são enterrados ou queimados com ou sem sacrifícios (nomeadamente de animais); outros são conservados embalsamados ou defumados; outros ainda são * Bolsista de Pós-Doutoramento da Fundação Ciência e Tecnologia -Lisboa. 1 Clara Saraiva, "Embalming, Sprinkling and Wrapping Bodies: Death Ways in America, Portugal and Guinea-Bissau: A Cross-Cultural Study", Symposia, Journal for Studies in Ethnology and Anthropology, Craiova, Center for Studies in Folklife and Traditional Culture of Dolj County, (2004), pp. 97-119. Centrando-se numa análise transcultural sobre a morte em três contextos diferentes, localizados na Europa, na África e nos Estados Unidos da América, este artigo mostra algumas das especificidades dos ritos mortuários inerentes a cada um dos contextos. As inúmeras questões levantadas hoje, individual ou coletivamente, no seio de algumas famílias, em Angola, em torno da morte, dos mortos, dos rituais mortuários, da guerra e das suas conseqüências, motivaram-me a refletir sobre estes tópicos, no contexto angolano. Contudo, além de uma vasta extensão territorial, de uma diversidade climática e de uma multiplicidade de fauna e flora, Angola é caracterizada por uma variedade cultural marcada pela coabitabilidade de diferentes grupos sociais, com identidade própria, desde os bakongos, os ovimbundus, os ngangelas, os cokwes, os handas, os nkhumbis, os ngambwes, os nyanekas, os kuanyamas, os kuvales, os kimbundus, entre 2 Peter Metcalf e Richard Huntington, Celebrations of Death. The Anthropology of Mortuary Ritual, Cambridge, Cambridge University Press 1991; Robert Hertz, "Contribución a un estudio sobre la representación colectiva de la muerte", in idem, La muerte y la mano derecha, Madri, Alianza Universidad, [1909] 1990. 3 Metcalf e Huntington, Celebrations of Death. 4 Arnold Van Gennep, Os ritos de passagem, Petrópolis, Editora Vozes, [1909] 1978.
doi:10.9771/aa.v0i37.21157 fatcat:4m7m36yfvvee7jzpxt2b5z63nq