O ofício como operador de saúde

Yves Clot
2013 Cadernos de Psicologia Social do Trabalho  
O texto trata da situação de trabalho atual em que os chamados riscos psicossociais se tornam uma preocupação para a gestão do trabalho. Apresenta uma crítica aos modos como a questão vem sendo enfrentada pelas empresas na França, propondo outras saídas, fundamentadas na linha teórica da clínica da atividade. Conclui pela importância do cuidar do ofício em todas as suas instâncias: impessoal, transpessoal, interpessoal e pessoal. Cada profissional, com seus colegas, é responsável por manter a
more » ... quitetura do ofício, no contato com as surpresas do real, sustentá-la naquilo que a mantém de pé: a qualidade do trabalho sempre posta em questão. A saúde no trabalho talvez tenha aí sua fonte. Palavras-chave: Clínica da atividade, Ofício, Riscos psicossociais. Work as a service of health The text discusses the present work conditions in which the so called "psychosocial risks" become worries for the work management. Some criticism is presented to the ways the issue has been dealt with by French enterprises, proposing other ways out, based on the clinic of activity. It concludes by the importance of taking care of work in all its instances: impersonal, transpersonal, interpersonal and personal. It is each professional's responsibility towards their colleagues to maintain the work's architecture in contact with the surprises of reality, sustaining it by the means of continuous questioning of the quality of work. Health at work might spring from this. amos partir de um exemplo. E esse exemplo é a reação de um dos principais protagonistas da situação que se criou na França com os suicídios que ocorreram na empresa de telefonia France Télécom: a reação de seu ex-presidente, D. Lombard. Em outubro de 2009, ele respondia à questão de um jornalista que lhe perguntava por que empregados "bem pagos e protegidos do desemprego" chegariam ao suicídio, cometido no próprio local de trabalho. V Eles são efetivamente muito ligados à empresa. Temos aí um lado muito positivo: nossos empregados são implicados, motivados, devotados. A despeito da crise que atravessamos, eles trabalham e a empresa anda. Mas essa ligação visceral também faz que alguns esperem tudo da empresa, que se torna algo como uma grande família, onde tudo vira um jogo afetivo. Se é pedido que mudem de posto de trabalho, pensam que nós não os amamos mais: tudo que fazemos visa exatamente permitir mantê-los todos. Trabalho: um jogo afetivo? Tudo se tornou um "jogo afetivo". O psicólogo do trabalho não deveria se espantar com isso. Será que se pode ter devotamento sem afeto? Implicação sem que os implicados se sintam como alguém que conta para alguma coisa que não diga respeito apenas aos dirigentes? Pode-se sustentar que a empresa não é uma família e, ao mesmo tempo, reassegurar aos empregados que eles são amados, retomando os traços do paternalismo mais tradicional? E isso no mesmo momento em que aquilo que eles amam -seu trabalho e sua história -é maltratado? 1 Équipe de clinique de l'activité et psychologie du travail (CRTD).
doi:10.11606/issn.1981-0490.v16ispe1p1-11 fatcat:5kb6auwgn5htzgmdeb7kxhk4hy